É
dia 14 de outubro, e, como meus planos lunáticos estão dando certo,
estamos em Teresina, num calor de fazer sulista infartar só de olhar
pra fora do hotel. Minha
armadilha já tá lançada
pra que meu amigo
Leandro seja pego de surpresa em sua casa, nesse dia que é o do seu
aniversário, no bairro Vermelha Sul.
V
i n t e a n o s e s e i s m e s e s. É o tempo que passou desde o
início da nossa amizade postal, em abril de 1996. Quando
a expressão “amizade virtual” começou a se concretizar entre as
pessoas do meu dia a dia, eu já era PhD em amizades à distância,
mas pelo correio convencional. Leo
é o último dos meus grandes “amigos de carta” que me falta
conhecer pessoalmente, pelo menos dentre os mais chegados. Ele não faz ideia que
planejei esses meus trinta dias de férias em torno do compromisso
número um que é aparecer
de surpresa na sua porta, cantando parabéns com um bolo na mão, no
dia do seu aniversário.
Quando,
meses antes, contei empolgadíssima
a ideia
pro querido & parceiro de viagens, ele fez uma cara
de desgosto e se limitou a dizer: “tu sabe que esse tipo de mico
nunca dá certo, né?”, e eu respondi que “eu sei, mas deixa eu
fazer uma dessas uma vez na vida!”
Aproveitando
ter registrado no facebook a passagem relâmpago, um dia antes, pelo
Museu do Amanhã, com a amiga Marcinha (“a menor gigante que
conheço”), ligo pro Leo, já no hotel em Teresina, pra despistar,
lhe dando os parabéns de sempre, e digo que estamos no Rio, viu a
foto? Tá um calor aqui no Rio, sabe, e ele me conta que "lá" também, e que na
manhã seguinte, sábado, vai
ter a festa dele na casa da irmã e coisa e tal, com
piscina e tudo. Ebaaaaa!, se alegra em segredo a parte do meu cérebro
que ainda não derreteu.
Eu
vigiando seus passos pelo zap,
lá vamos nós atrás dum bolo de aniversário. Encontramos um
supermercado, tem um bolo lindo, mas primeiro, pelamoooooordedeus,
um tubo
grande de protetor solar fator
mil, porque o fator trinta que trouxe do sul não dá nem pro cheiro. Isso
porque em Teresina não arriscamos uma quadra sem táxi. O que em
qualquer outro lugar sempre nos parece frescura, aqui é
sobrevivência pura.
Vinte
anos e seis meses. Um amigo que só conheço por cartas. E telefone,
e-mail, fotos,
presentes, etc. O Leo é a pessoa que mais me serve de exemplo quando
lembro que quem quer estar na vida de alguém, mesmo longe, consegue.
Ele participa ativamente da minha, há mais
de vinte anos. Até doce de caju feito pela dona Raimunda, sua
mãe, ele faz chegar em mim, em
nós, em Laguna, no sul brasileiro que ele ainda não conhece, ou melhor, só
por carta. Por enquanto.
Mas
voltando a Teresina antes
que o sol de trocentos graus derreta o bolo.
Instruções
ao querido pra registrar o encontro. O
taxista procura a casa, sei as
coordenadas de cabeça, vinte
anos e seis meses endereçando
os envelopes pro mesmo lugar.
Mando
um zap jogando um verde, ele diz
que tá em casa, jogando game
com seu sobrinho. Peço
que não saia porque lhe mandarei uma surpresinha por um motoboy. Já na chegada o flagramos tentando pegar um melhor sinal de
internet em frente a sua casa. A sobrinha Isabela está em redor,
sempre.
FELIZ
ANIVERSÁRIO!, desejamos
do jeito mais realizável que
conseguimos. Hoje, os 3.425 quilômetros que separam nossas casas são
apenas números: nada
atrapalham nesse
abraço improvável mas muito verdadeiro.
Na hora tenho vontade de mandar pro face nosso grande troféu, o
souvenir máximo desse encontro: o vídeo de 33 segundos que registra
nossa chegada na escaldante Rua Valdivino Tito. Mas os amigos nem
acreditariam me vendo postar algo em tempo real, capaz de pensarem que é vírus. Depois de duas décadas salivando, o bolo é acompanhado com cajuína bem gelada, sim, senhor :D
A
noite ainda nos presenteia com um outro grande encontro: o n.
4 de Elba + Alceu + Geraldo, no
Teresina Hall. Leo não pode ir conosco, pois vai trabalhar nessa
noite. Mas ele, Isabela e tia Raimunda vão conosco ao shopping
comprar os ingressos.
E amanhã tamos lá na festa na casa da irmã,
pensa que eu esqueci, é, seu Leo?
(À
noite desse dia transbordante,
o show começa com uma vida de atraso. Guardo até quase no fim um
fiozinho de bateria da câmera, confiando no repertório, digo,
esperando pela morena tropicana que há de vir, ai, ai, oi, oi, eu mega piegas entregue à felicidade de um dia realizado, e ela vem e arrasa, digo, o Alceu nunca me decepciona).
Dia
14 de outubro de 2016. Um dia que pra
mim não é uma data apenas: é uma
celebração sem prazo de
validade. De grandes encontros
que minha memória de elefante nunca
há de me deixar esquecer.
Tá
fazendo um ano. Na época, no ato, vou contando a trama no
varejo, aos amigos do itinerário. Mas a distância é grande: pra pegar carona e registrar no atacado, é agora ou nunca mais.
4 comentários:
Qualquer hora vão fazer um globo repórter sobre a espécie Suyan muito natural que diz "carpe diem". Onde vive? Do que se alimenta? Como se reproduz? Tu és exclusiva Su ... A história é inspiradora, guardei essa parte: "O Leo é a pessoa que mais me serve de exemplo quando lembro que quem quer estar na vida de alguém, mesmo longe, consegue". ❤️
Obrigada, Re, pelo carinho e pela leitura!
Ei, e não é verdade? Às vezes uma pessoa está longe estando tão perto, e outras, está perto mesmo do outro lado do mundo, ou, nesse caso, do Brasil. Beijos!
Vc é o máximo! Estou com um "cisco" nos olhos após ler suas peripécias.💚🌼
Suyan, que lindo!
Engraçado que li o texto lembrando justamente de você, em Paraty, me falando sobre as pessoas que você conheceu por meio de cartas e que mantém contato até hoje :) Beijo grande!
Luísa
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